quarta-feira, 19 de maio de 2010

Sob a tristeza

o maio pelos caminho de barbeita
o lugar no topo do monte, gente que
resistiu a fomes e aos frios, generosa
na partilha, ávida das palavras dos que chegavam
do vale onde os do lugar do monte
iam comprar fósforos e querosene.
as palavras no tempo da penúria
sustento são:tépidos frutos maduros
sob a tristeza.os homens de barbeita,
gente generosa repito, quase
nada tinha para dar a não o ser uma honra
tão cristalina que só, talvez, certos humildes
preservam. Era o maio, as giestas
floridas na fímbria dos caminhos. mas era o maio,o
paveseano vício absurdo de improvavelmente ser feliz
em remotos lugares. volvia a casa com um lírio.
um lírio para a mãe.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Furões e os barbos

os que andam pelo maio e deixam a pegada
nos campos lavrados. o delírio dos peixes
do rio, insisto. o meu irmão enche o cacifo
de trutas pela tardinha, (acirra a minha
clausura pelo telemóvel) pesca com pena de gaio
vermelha e o luxor antigo, de quem era o
carreto: do pai? do pai que num dia
extraordinário de maio, à amostra
pescava babos, barbos enormes, para espanto
geral. Foi num dia de trovão, cantavam
os melros e os sapos iniciavam a maternal
caminha para a água, e o pai com o velho
luxor pescava barbos: com um isco que
apenas ilude truta ou achigã. Quem
é do mister, se não assistiu ao
maravilhoso fenómeno, não acreditará.
Eu vi, barbos grandes, enlouquecidos
pela paixão do maio, atacar a amostra,
iludidos pelo brilho do metal, a defender
um território que não é o seu. Alguns
rebentavam o fio, o pai atava outra amostra
e reiniciava o estranho jogo na boca
da barragem do ermal. os outros
pescadores à linha, com as suas canas
da índia, espantados com tamanha
abundância e desvario dos sisudos
barbos! maio. as pegadas que deixamos em
maio. o cacifo de truta não é o mesmo
que o cacifo dos caçadores que levavam
os furões para o monte: esse,
estreito, tinha a forma do animal o voraz.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Grilos e bogas

uma rima para esta melancolia
de ser maio e não poder calcorrear
o dia. o regresso a casa despojado dos peixes do rio
trutas, bogas cor de ouro, um barbo talvez
iludido na corrente. o maio pintalgado de melros
e corvos, esses eternos corvos que abjuraram as rotas antigas.
uma rima para tudo isto, tu sabe, não é fácil
porque os grilos cantam no silêncio dos teus olhos
alegria das dedaleiras na borda da caminho trava-me o passo.
no silêncio dos teus olhos parece verso
batido. parece, e talvez não seja: só ouve os grilos
quem sabe domar o silêncio.

sábado, 15 de maio de 2010

devoção

Ontem fui ver o papa, no Porto. Ofereceram-me preservativos. A Igreja está a mudar.

terça-feira, 4 de maio de 2010

O velho poço

uma rima colorida
para as ervilhas de cheiro
do meu quintal cheio de maio
e do seu fogo imaterial
não será rima infantil
enfim, não faz mal
é maio e não falarei
das cerejas nem das rãs
que morrem de amor
entre ao agriões do velho poço

uma rima
apenas uma rima colorida
para o fogo sensual

sábado, 1 de maio de 2010

Lenha verde

a mãe desaprendeu a fala.
a mãe cativa. só o verde
dos olhos me aperta
e murmura como se eu fosse ainda o rapazinho
desavindo com o sono.
digo, mãe
mãe, vou cortar lenha verde
zangarinho e alecrim na mata das dornadinhas
faremos uma fogueira pelo s.joão.

Giestas

trazem ramos de giestas.descem os
montes assim floridos: o primeiro dia
as giestas alumiam a casa
rito de espantar fome e penúria, diriam os velhos.
os que vêm de maio comem as derradeiras
laranjas cativos na cega paixão
das cerejas. às vezes sentam-se e contam
palavras que apartam
devagar dos bolsos. às vezes adormecem
e emigram no rumor da tarde.