*
imprudentemente
começo
a
lembrar-me
Mais prudentemente
começam
a
esquecer-me
Erich Fried
100 Poemas sem Pátria
Publicações Dom Quixote
sexta-feira, 29 de agosto de 2014
sábado, 23 de agosto de 2014
Nu
Quando estás vestida,
Ninguém imagina
Os mundos que escondes
Sob as tuas roupas.
(Assim, quando é dia,
Não temos noção
Dos astros que luzem
No profundo céu.
Mas a noite é nua,
E, nua na noite,
Palpitam teus mundos
E os mundos da noite.
Brilham teus joelhos,
Brilha o teu umbigo,
Brilha toda a tua
Lira abdominal.
Teus seios exíguos
- Como na rijeza
Do tronco robusto
Dois frutos pequenos -
Brilham.) Ah, teus seios!
Teus duros mamilos!
Teu dorso! Teus flancos!
Ah, tuas espáduas!
Se nua, teus olhos
Ficam nus também:
Teu olhar, mais longe,
Mais lento, mais líquido.
Então,dentro deles,
Boio, nado, salto
Baixo num mergulho
Perpendicular.
Baixo até o mais fundo
De teu ser, lá onde
Me sorri tu'alma
Nua, nua, nua...
Manuel Bandeira
Testamento de Pasárgada, ed. NOva Fronteira, 1980
Ninguém imagina
Os mundos que escondes
Sob as tuas roupas.
(Assim, quando é dia,
Não temos noção
Dos astros que luzem
No profundo céu.
Mas a noite é nua,
E, nua na noite,
Palpitam teus mundos
E os mundos da noite.
Brilham teus joelhos,
Brilha o teu umbigo,
Brilha toda a tua
Lira abdominal.
Teus seios exíguos
- Como na rijeza
Do tronco robusto
Dois frutos pequenos -
Brilham.) Ah, teus seios!
Teus duros mamilos!
Teu dorso! Teus flancos!
Ah, tuas espáduas!
Se nua, teus olhos
Ficam nus também:
Teu olhar, mais longe,
Mais lento, mais líquido.
Então,dentro deles,
Boio, nado, salto
Baixo num mergulho
Perpendicular.
Baixo até o mais fundo
De teu ser, lá onde
Me sorri tu'alma
Nua, nua, nua...
Manuel Bandeira
Testamento de Pasárgada, ed. NOva Fronteira, 1980
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Manuel Bandeira,
Pasárgada
quinta-feira, 21 de agosto de 2014
Treno
Ai a tua nudez Ai a tua mudez
Ó taça de cristal sobre veludo preto
Quando voltas de novo a ser aquele vento
que já antes do amor se começa a mover
David Mourão-Ferreira
Obra Poética, 2º vol., Livraria Bertrand, 1980
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agora é verão,
david Mourão-ferreira
Açude
O rio canta a noite toda
pelas suas cachoeiras destemidas
nos moinhos de s.pedro
das águas passadas
silenciosos os rodízios
a mó fora do poiso
mas o rio canta a noite toda
antiquíssima alegria
da liberdade que
transborda açudes
pelas suas cachoeiras destemidas
nos moinhos de s.pedro
das águas passadas
silenciosos os rodízios
a mó fora do poiso
mas o rio canta a noite toda
antiquíssima alegria
da liberdade que
transborda açudes
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domingo, 10 de agosto de 2014
Ensinamento
Minha mãe achava estudo
a coisa mais fina do mundo.
Não é.
A coisa mais fina do mundo é o sentimento.
Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,
ela falou comigo:
"Coitado, até essa hora no serviço pesado."
Arrumou pão e café, deixou tacho no fogo com água
[quente.
Não me falou em amor.
Essa palavra de luxo.
Adélia Prado
Bagagem
Editora Guanabara
a coisa mais fina do mundo.
Não é.
A coisa mais fina do mundo é o sentimento.
Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,
ela falou comigo:
"Coitado, até essa hora no serviço pesado."
Arrumou pão e café, deixou tacho no fogo com água
[quente.
Não me falou em amor.
Essa palavra de luxo.
Adélia Prado
Bagagem
Editora Guanabara
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Adélia Prado,
os poemas da minha vida
segunda-feira, 4 de agosto de 2014
O lobo bom
É a mais fabulosa história infantil
contada a adultos: o banco bom
comeu o banco mau. O banco bom
fazia parte do banco mau.
Mas numa noite, numa só noite,
o governador, astuto, atento, bom
amigo do erário público, tomou
o lugar do primeiro-ministro e, num
rasgo de génio, dir-se-ia divino,
apartou o lobo do cordeirinho.
O governador (como se chama o
governador dos bancos bons ou
maus, tanto faz?) é pois um fortíssimo
candidato ao Nobel. Lobo Antunes
terá de esperar mais algum tempo.
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Banco de Portugal,
banco mau e banco bom,
Ricardo Salgado
sexta-feira, 1 de agosto de 2014
Ouve, Israel
Quando fomos perseguidos
era um dos vossos
Como posso continuar a sê-lo
se vos tornais perseguidores?
A vossa aspiração era
tornar-vos como os outros povos
que vos assassinavam
Agora tornaste-vos como eles
Sobrevivestes
aos que foram cruéis para convosco
Acaso a sua crueldade perdura
agora em vós?
Ordenastes aos vencidos:
"Descalçai os sapatos"
Tal como ao bode expiatório
impeliste-los para o deserto
para a grande mesquita da morte
cujas sandálias são areia
eles porém não aceitaram os pecados
que quisestes impor-lhes
A marca dos pés nus
na areia do deserto
prevalece sobre o rasto
das vossas bombas e tanques
Erich Fried
trad. Teresa Balté
100 Poemas sem Pátria
Publicações Dom Quixote, 1979
era um dos vossos
Como posso continuar a sê-lo
se vos tornais perseguidores?
A vossa aspiração era
tornar-vos como os outros povos
que vos assassinavam
Agora tornaste-vos como eles
Sobrevivestes
aos que foram cruéis para convosco
Acaso a sua crueldade perdura
agora em vós?
Ordenastes aos vencidos:
"Descalçai os sapatos"
Tal como ao bode expiatório
impeliste-los para o deserto
para a grande mesquita da morte
cujas sandálias são areia
eles porém não aceitaram os pecados
que quisestes impor-lhes
A marca dos pés nus
na areia do deserto
prevalece sobre o rasto
das vossas bombas e tanques
Erich Fried
trad. Teresa Balté
100 Poemas sem Pátria
Publicações Dom Quixote, 1979
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